A Escola Austríaca e o Academicismo: Uma breve revisita à História do Pensamento Econômico

As raízes da Escola Austríaca
Muitos perguntam o motivo dos economistas austríacos serem rejeitados no meio acadêmico. Para respondermos a essa pergunta é preciso levantarmos os fatos históricos. A partir da década 1870, o pensamento econômico mudou radicalmente. A ideia clássica do valor (Teoria do Valor-Trabalho) passou a ser cada vez mais questionada. Desse questionamento surge, então, a Teoria da Utilidade Marginal, desenvolvida de forma independente por três pensadores. 

Sim, independente pois eles não se conheciam, viviam em países distintos mas em vários países já se buscava soluções que a Teoria do Valor-Trabalho não respondia satisfatoriamente (um exemplo é o paradoxo da água e diamante). Os 3 pensadores são: William Stanley Jevons, Leon Walras e Carl Menger. Esse último foi o fundador da Escola Austríaca. Portanto, enquanto o mundo econômico ainda falar em Utilidade Marginal, estará falando, mesmo indiretamente, em Escola Austríaca.

A revolução keynesiana

De sua origem em 1870 até a década de 1930, a EA permaneceu muito influente. Nesse período, tivemos contribuições que são usadas até hoje, – além da já citada Utilidade Marginal – destacando a Teoria do Custo de Oportunidade, Teoria da Preferência Temporal e Teoria dos Ciclos Econômicos. Isso já derruba o mito de que a Escola Austríaca é irrelevante academicamente. Há de se reconhecer, porém, que essa relevância até aqui mostra-se puramente histórica. Mas vamos prosseguir.

Em 1936 Keynes lança a sua obra Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda e ganha os holofotes, fazendo a Escola Austríaca cair no esquecimento. Foi o tempo necessário para o keynesianismo criar raízes profundas no pensamento econômico moderno. E assim foi até a crise de 1970, quando os modelos keynesianos já não surtiam mais os efeitos desejados e assim emergiu a então chamada Nova Economia Clássica ou Escola das Expectativas Racionais, capitaneada por Robert Lucas. 


Um respiro para as ideias liberais

Nesse contexto de contestação às ideias keynesianas que a Escola Austríaca adquire um novo fôlego. O já idoso Friedrich von Hayek, antigo rival de Keynes no final dos anos 1920 e meados dos anos 1930, ganhou o Prêmio Nobel de Economia em 1974. Parecia, então, que o mundo começava a ouvir menos os apelos keynesianos e mais os constantes avisos de Hayek.

Enfim, as ideias do livre mercado ganharam propulsão e foram ouvidas novamente, principalmente no governo Reagan, nos EUA, e Thatcher, no Reino Unido. Na academia também foi igual, modelos como Curva de Phillips foram abalados, teorias pró-mercado se solidificaram, assim como advertências sobre manipulação das taxas de juros e expansão creditícia e etc.

Ideias importam e elas criam raízes 

Mas, como dito anteriormente, de 1936 a 1970, o keynesianismo vigorou triunfante, sendo o período necessário para fincar terreno. Então não seria correto dizer que houve um completo retorno da Escola Austríaca ao centro dos debates acadêmicos. O que vimos em meados dos anos 1970 e decorrer dos anos 1980 foi meramente um sopro de um de seus remanescentes.

Vale destacar, todavia, que Hayek não ficou parado. Durante os anos 1940, ele criou a Mont Pèlerin Society, uma organização de notáveis intelectuais defensores do liberalismo. Se não fosse esse plano de Hayek, muito provavelmente não teríamos uma ofensiva organizada contra o intervencionismo estatal e o socialismo. 

Em todo caso, é possível dizer, ainda que a grosso modo, que o mundo acadêmico atualmente é regido, de um lado, pelos herdeiros de Keynes e, por outro lado, os herdeiros de Hayek (considerando aqui o próprio Milton Friedman como um pensador influenciado diretamente por ambos). O próprio chegou a afirmar que foi influenciado por Keynes quanto a adoção da macroeconomia, mas, ao mesmo tempo, foi um pensador próximo a Hayek, sobretudo na defesa do livre mercado.

Mainstream e Mainline

Claro, é preciso reconhecer que hoje a Escola Austríaca, apesar da sua inegável contribuição histórica, não faz parte do mainstream econômico. Isso se deve, a meu ver, ao positivismo econômico, que busca recriar cenários, condições e explicações sobre o comportamento dos agentes através de ferramentas comumente utilizadas nas ciências naturais, como a física. Seja como for, o Professor Peter Boetkke faz uma elegante distinção entre o que ele chama de mainstream (convencional) e mainline (linha principal).

Como ele chegou a me dizer: “A Escola Austríaca se enquadra diretamente na linha principal. Já o mainstream é o que está na moda atualmente nos principais departamentos de economia. Ele afirma que a Escola Austríaca pertence à linha principal pois, em sua visão, ela preserva a tradição dos primeiros economistas.

Um olhar para o futuro
Após a crise financeira de 2008, novas alternativas ao modelo acadêmico vigente estão sendo consideradas, sobretudo após surgimento das criptomoedas (coincidentemente ou não, também em 2008), a desconfiança relacionada aos Bancos Centrais (eles estavam regulamentando o quê ou quem para impedir a crise?!) e a crescente popularidade da Economia Comportamental (vide o mais recente Prêmio Nobel) contestando a matematização dos seres humanos. 

Seriam esses um indicativo da crescente popularidade da Escola Austríaca? Podemos dizer que sim. Essa popularidade poderá mudar os rumos da academia no longo prazo? Se se manter nesse ritmo e mais adeptos da EA trabalharem nos cursos de graduação e pós graduação, talvez. É correto então afirmar que a Escola Austríaca é irrelevante para o mundo econômico? Absolutamente não.

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